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Pessoas preocupadas com a prevenção

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

21° Domingo do Tempo Comum (Pe Carlo)

O nosso Evangelista, Lucas, ama apresentar Jesus como Deus que caminha no meio dos homens, figurando uma longa e atenciosa viagem que alcança, em seu progresso, as dificuldades e os questionamentos que as pessoas vivem. Jesus de Lucas não é um “guia” que ensina caminhos esotéricos, não é um mestre de espírito, é simplesmente Deus que caminha no meio dos homens enquanto os homens somente vêem um homem. Eis, então mais um episódio que ocorreu ao longo do caminho rumo a Jerusalém, figura da Jerusalém celeste na qual será realizado o julgamento final da história do mundo.
Ao longo do caminho existe sempre uma pessoa que pergunta: «“Senhor, é verdade que são poucos os que serão salvos?”»; o indivíduo do nosso caso é um personagem não identificado. Na verdade nele podemos ver o reflexo de todos os homens que têm a coragem de ver face a face a realidade do mundo e não se iludem mais com o mito do homem capaz de se autoconstruir (como, por exemplo, pensa uma grande parte do “ateísmo prático contemporâneo” e alguns sistemas de pensamento ético tais como a teosofia, a maçonaria, a “neognose” –hoje substituída com uma expressão mais atraente: “poder da mente”-, e outros). A capacidade de ver o mundo como é, é própria do homem sábio e realista, capaz de ver e buscar uma alternativa; não é fuga para um mundo etéreo ou pragmatista: é coragem de ser e existir. A religião verdadeira, a atitude correta e honesta diante de Deus, permite ao homem ver o mundo com outro prisma para poder agir neste com maior eficácia. O nosso personagem também é um homem que se decidiu em favor da dimensão religiosa e vê em Jesus alguém que lhe possa dar uma resposta. Ora, o questionamento que ele faz, encontra a sua raiz num problema de fundo bastante comum: o que eu ganho seguindo o caminho religioso? Vale a pena ser tão diferentes das pessoas que são bem sucedidas por causa de opções que não levam em conta Deus?
Quando não se encontra tão facilmente a resposta, eis então que, infelizmente, a religião a qual deveria servir também para gerar unidade entre as pessoas, paradoxalmente se transforma ela mesma em justificativa para divisões. O mundo é dividido entre “os bons” e “os outros”; se recorre à hipótese de um julgamento final no qual as pessoas que se comportaram bem na vida receberão o seu prêmio e os outros um castigo proporcional... Era esta a visão do Antigo Testamento, à qual estava preso o nosso interlocutor. Tal maneira de ver a religião movia grupos sempre mais integralistas às mais exageradas formas de perseguir em seus mínimos detalhes as regras e normas religiosas. É o que acontece toda vez que falta conteúdo, ainda hoje: recorre-se às formas, quanto mais detalhadamente e ostensivamente possível. Os Talmude, por exemplo, nos trazem informações de que um verdadeiro fiel israelita devia seguir pelo menos 350 regras para não infringir a lei do sábado....! (Quando já havia-se perdido o sentido da autêntica relação entre Jhavé e seu povo).
Tudo isto está à base da pergunta; dado por certo de que a maioria das pessoas não segue a religião, dado por certo que somente poucos seguem a religião como deve ser, dado por certo de que as normas são demais para serem seguidas corretamente e que talvez somente alguns o consigam, resta então a pergunta: «É verdade que são poucos os que serão salvos?”». O questionamento parece já dar como certo que é isto que acontecerá. O indivíduo busca somente uma confirmação. O verbo que ele usa é um passivo: “serão salvos” (e não: “se salvarão” como traduzem alguns, –o verbo “salvar” por si próprio indica o ato de um outro que faça o que o sujeito não consegue fazer por si); deste modo o nosso homem indicava a sua convicção de que serão poucos os que Deus salvará da desgraça final, uma vez que somente poucos foram capazes de seguir os preceitos e, assim, agradar o Altíssimo.
Nota-se então como Jesus não responde sobre este plano. Não é este o critério.
De imediato vê-se como o Senhor não faz da salvação um prêmio ou uma meta conquistada; a salvação é representada pela imagem de um banquete onde existe uma porta aberta, simplesmente aberta. Sabemos bem que a imagem do banquete, no Antigo Testamento e para Jesus, é essencialmente ligada à festa. Esta, a festa, é o sentido final de tudo, a festa é o lugar para onde corre a história da humanidade inteira, é o lugar onde Deus quer se encontrar com todos a fim de poder oferecer o que possui de melhor, -segundo a imagem de Isaías (25,6-10).
A questão, então não se coloca sobre uma conquista e o método melhor para alcançar a meta, pois esta é garantida a todos; a questão é como entrar. Ou seja, não tanto sobre os meios mas sim a quanto à condição em que o homem se põe, condição que lhe permite entrar ou não na sala da festa.
Mais um elemento que está claro para Jesus: não existe a possibilidade de delongar ao infinito as opções. É uma das doenças que hoje nos atingem mais diretamente, não é difícil perceber como as decisões importantes da vida hoje são “adiadas” o quanto mais possível. Alguns para justificar este “eteno” adiamento até projetam isto numa “outra vida” feita de reencarnações progressivas. A história não é assim: Aquele que «se levanta» (o verbo recorda o “levantar-se do sono da morte”, sugerindo assim uma analogia com o Ressuscitado, ao qual compete o julgamento da história) «fechará a porta» num determinado momento. A seriedade deste ato reconduz à seriedade com qual deve ser considerada a nossa vida, nos ajuda a olhar com realismo o que vivemos e as opções que precisamos fazer; adiar indefinidamente é uma fuga que conduz num beco sem saída.
Creio que, para entender melhor o que Jesus queria nos transmitir, precisamos recorrer ainda ao Livro de Gênese; em dois episódios ligados entre si encontramos elementos que explicitam as palavras de Jesus.
A caminho para Harã, numa localidade identificada mais tarde com Betel, Jacó viveu uma experiência mística à qual Jesus três vezes fez referência; sentiu como o Deus que chamava “Altíssimo” na verdade estava mais perto do que se podia imaginar e que o acesso a Ele não era proibido (todas as religiões daquela época viam as divindades como proibidas), a experiência é descrita com a imagem de um sonho (Gen. 28, 10ss). Ao contrário! O sonho termina com uma expressão de admiração e temor: «Este lugar é terrível, é a porta do céu!».
Como em outro lugar (Jo. 10,1-9), Jesus se interpreta aqui como aquela “porta” que dá acesso ao céu. Ao indivíduo que lhe perguntava sobre o número daqueles que forem aceitos por Deus, Jesus responde que o Pai aceita todos os que passarem pela porta que é o Cristo. Não há outro critério, Jesus é a porta e entrar por ela significa penetrar o modo de pensar e de agir de Jesus, significa “entrar” em sua vida. Tudo o que o homem fizer, mesmo bom, deve necessariamente passar pela comunhão com Jesus, sem esta os atos se tornam insignificantes: «não vos conheço» responderá o dono da casa; sabemos que “conhecer” na linguagem bíblica significa ter uma relação totalmente transparente e quase uma fusão de pessoas. Eis então o primeiro questionamento que se nos põe: é este o prisma com o qual vejo a minha vida de fé? Que espaço ainda ocupa em mim a tentação de me sentir “justo” em comparação com “outros”, como o interlocutor de Jesus? Entrar pela porta que é Cristo é entrar no mundo que Cristo oferece, nas relações como Ele as propõe, nas atitudes que Ele teve... é assim também para mim?
Jesus prossegue indicando as qualidades desta “porta”. Ela é «estreita», o que não significa que é “difícil”, que pode ser alcançada somente por alguns privilegiados etc. Estreita, significa simplesmente que é o que é, que não se adapta às pessoas, não é um caminho que cada um molda conforme o que mais lhe apraz. A porta é o que é; e o que “é” é a vida de Jesus como Ele a viveu. Não é a porta que se “adapta” às pessoas, mas sim o contrário.
Ora, Jesus diz que é “estreita”, estreita para todos, porque cada um possui uma bagagem que lhe dá segurança e com a qual pretende enfrentar a vida achando de ter nesta bagagem tudo o que é necessário. É como uma mochila que carregamos nas costas na hora de fazer uma viagem, nela colocamos uma grande quantidade de coisas achando que todas têm o mesmo valor e que são indispensáveis, ou que um dia poderão nos servir.... Mas, quanto mais o tempo passa, tanto mais esta mesma mochila se revela pesada e quanto mais coisas houver dentro tanto mais difícil se torna conseguir passar por uma porta que é mais estreita do que se imagina. Estreita, estreita porque o que permanecerá é somente aquilo que nos faz mais semelhantes a Deus: um amor de reciprocidade sem fim. É isto que encontraremos Nele uma vez entrados pela porta; isto é o necessário para poder participar de um banquete festivo, o mais é providenciado pelo Anfitrião. No entanto há ainda quem não queira deixar nada, mas deste modo tudo fica bem mais difícil, impossível até. Evidentemente Jesus sugere que estejamos dispostos a fazer uma escolha radical, uma escolha que pode até deixar marcas mas estabelece uma profunda relação com Deus. O nosso texto traz uma alusão ao segundo trecho de Gênese no qual o mesmo Jacó vive um segundo aspecto daquela experiência mística da qual já fizemos menção. O texto de Gen. 32,23-33 descreve o outro lado da moeda de um autêntico encontro com Deus, se o primeiro aspecto é como um sonho, o segundo se transforma realmente numa “luta”. É comum encontrar alguns que traduzem assim as palavras de Jesus: «Fazei todo esforço possível para entrar...», mas esta tradução não corresponde às palavras relatadas pelo Evangelista que soam assim: «Lutem...» (Agwnizesqe = “agonia” é a luta e, especificamente, a luta decisiva). Não se trata então de fazer “o possível”, pois este “possível” é muito relativo e cada um coloca o limite que desejar ao “possível”; sem contar que esta tradução faz perder a referência à “luta” de Jacó com Deus que interessa mais o nosso contexto. Trata-se então de travar uma luta decisiva contra tudo quanto o que Deus nos propõe deixar, e o seu adversário, o nosso “eu” que crê precisar de muitas coisa para ser feliz. Jacó luta durante a noite inteira, assim como o homem lutará durante todo o período que antecede a aurora de um mundo renovado. Nesta luta, o único desejo de Jacó não é demonstrar superioridade (como bem no fundo faz o ateísmo) ao contrário, a luta de Jacó é humilde, ele luta para receber uma benção... e consegue, mesmo que isto lhe custe ficar mancando de uma perna. E mais, além da benção Jacó aprende a conhecer a Deus; de fato a luta honesta com alguém nos faz conhecer quem somos e quem é o outro que está à nossa frente, assim como fazem as crianças quando brincam de luta: ninguém perde, os dois ganham. Assim, um entra a fazer parte da vida do outro, um “conhece” o outro assim como o nosso trecho sugere; situação essencial para entrar no banquete da festa.

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